segunda-feira, 2 de março de 2015

Parque Augusta: verde que te quero ver-te

Há quatro anos quando estava em processo de busca por um espaço para chamar de meu, sem querer dei de cara com esse apezinho: pequeno, como o tamanho do meu bolso, mas iluminado, com pé direito alto, silencioso, apesar de ser no Centro de São Paulo, prédio simples, porteiros bacanas (ai saudades do Sr.Pedro) e um grande atrativo: uma enorme (e única) janela com uma boa vista que além de outros prédios exibe árvores e, na época, uma tenda de circo.

Quatro anos se passaram e naquela mancha verde eu já vi passarem carros de um estacionamento, festas, muita gente, cães passeando com seus donos e, durante todo o tempo, muita gente pedindo pelo Parque Augusta.

Eu vim de uma cidade do interior na qual eu, pessoalmente, não me recordo de ver manifestações da população em lutar por direitos legítimos. Em minha cidade, desde que me lembro convivemos com enchentes terríveis e os espaços públicos são totalmente subutilizados. Eu me dei conta disso especialmente durante a faculdade. No curso de Turismo, ao contrário do que pensam os leigos, aprendemos a desenvolver produtos turísticos e de lazer. Estudamos a cidade, sua dinâmica e possibilidades lúdicas, de Lazer e de Turismo para os espaços, e isso foi uma das coisas que mais chamou minha atenção durante o curso, concluído há anos, mas que nunca esqueci, talvez por notar a diferença frente a minha cidade.

Possivelmente esse também seja o motivo de eu ter vindo morar nessa região, tão perto de tudo, tão cheia de opções e ao mesmo tempo tão contraditória, pois temos muitas opções de bares, restaurantes, mas para um programa simples, como um piquenique, uma tarde de brincadeira com as crianças, para pôr os pés na terra, pra eu pegar um matinho pro meu gato brincar, acabamos tendo de nos deslocar para outras regiões da cidade, uma vez que o espaço que dispomos não é nosso. Com isso nosso espaço é incompleto, uma vez que não se vive só de barzinhos e restaurantes.

A população do meu bairro de hoje, ao contrário da população da cidade de minha infância, pede, suplica, faz festa, implora, manda e-mail, ocupa o espaço, reivindica, pixa muros, faz petição na internet, faz abaixo assinado, mobiliza gente conhecida, divulga na imprensa, protesta, grita... e ainda assim estamos no aguardo de uma reintegração de posse absurda, apesar de promessas da prefeitura, apesar de haver instrumentos legais que impedem que isso ocorra e tudo por conta da especulação imobiliária.

As incorporadoras dizem que manterão as áreas de mata tombadas, dizem que permitirão o acesso da população, mas não é esse o prêmio de consolação que a população da Consolação quer. Queremos o Parque para que o mesmo possa ser realmente ocupado como o bairro merece. 

Hoje há shows no local, piqueniques, crianças brincando e correndo, aulas, projeção de filmes, oficinas, palestras e diversas outras atividades criadas espontaneamente pela população, sem nenhum apoio governamental. Trata-se de um espaço necessário, com múltiplas possibilidades de uso e que faz parte da identidade local. Vemos as mesmas pessoas dos bares descolados ali sentadas na grama, tomando sol, tocando música, respirando um ar com cheiro de mato e madeira molhada, ainda que o parque esteja no Centro de São Paulo.

Voltando à época da faculdade me lembro de um termo que estudamos, falamos e comentamos muito: o "não lugar" : "A definição de não-lugar é um conceito proposto por Marc Augé, antropólogo francês, para designar um espaço de passagem incapaz de dar forma a qualquer tipo de identidade, isto é, segundo Marc Augé todo e qualquer espaço que sirva apenas como espaço de transição e com o qual não criemos qualquer tipo de relação é um não-lugar! Assim, este define-os como sendo espaços de anonimato nosso dia-a-dia, na nossa vida e na nossa consciência. Estes espaços são, portanto, descaracterizados e impessoais, não lhes são atribuídas quaisquer tipo de características pessoais exatamente porque não tem para nós qualquer tipo de significado ou história." Pois é como um "não lugar" que eu vejo o futuro do querido Parque Augusta, caso vença a especulação imobiliária e o poder de quem tem mais dinheiro. Teremos um espaço de passagem no bairro, mas não um espaço do bairro.

Eu espero de verdade continuar a morar aqui, com vista parque, e, toda vez que eu quiser descer e aproveitá-lo ele estará ali, se possível mais cuidado, com equipamentos de lazer e mais conforto que as pessoas merecem, que minha tão amada Sampa merece.

Quem quiser saber mais sobre o Parque Augusta e toda a mobilização em torno dele há muita informação aqui e aqui.

#desapropriahaddad 
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